LayHan, À Mão

1/11/2014

À Mão

Do lado de fora, as nuvens desmanchavam-se em chuva. Sentado na beirada da cama, com os olhos coçando de sono, Zhang Yixing soltou um suspiro inaudível quando olhou para os horários das aulas que fixara em um mural preso na porta do seu quarto. Se fosse qualquer outro dia, teria resmungado alguma coisa, inventado uma mentira qualquer para seus pais e então se arrastado de volta para a cama – como provavelmente todos os seus colegas fariam. Mas, naquele dia em especial, teria aula com seu professor preferido de matemática e por mais que dissesse para si mesmo que não seria uma boa ideia pegar três ônibus para chegar à escola com aquele tempo, não conseguiu se convencer a permanecer na cama por mais tempo.

Pulando de um pé para o outro – em uma tentativa inútil e meio ridícula de se aquecer – andou até o banheiro, arrancando as roupas pelo caminho e ligando a ducha no mais quente que conseguiu. Olhou para o reflexo no espelho e gemeu quando notou seu estado lastimável. Os cabelos estavam desgrenhados, o rosto amassado e, droga, havia nascido outra espinha em seu rosto. Sentiu vontade de espremê-la, mas sabia que iria piorar a situação caso tentasse. 

Estava passando pela típica fase que todo adolescente da sua idade passava. A fase em que a mão não desgrudava do próprio pau e que espinhas nasciam em seu rosto e que tinha sérios problemas para definir sua personalidade e, como se não bastasse, sua autoestima estava não maltratada que o próprio Yixing sentia pena de si mesmo. Não era popular na escola e muito menos entre as garotas. Não era o mais inteligente da turma e não se destacava nos esportes. Era simplesmente ele. Zhang Yixing, aquele que ninguém sabia o nome ou se importavam em perguntar. Mais um aluno chinês em meio a tantos outros. E mesmo que não se importasse realmente com nada daquilo, às vezes gostaria mesmo de ter algum reconhecimento em qualquer coisa que fosse, por mais ínfima que fosse.

E isso às vezes acontecia quando estava com seu professor de matemática.
Não que Lu Han desse alguma atenção a mais à Yixing, desfavorecendo os outros estudantes – ele era contra o favoritismo – mas o moreno sentia que entre os dois havia alguma ligação diferente, uma ligação que o professor não compartilhava com ninguém além dele. Isso o deixava imensamente orgulhoso de si mesmo, porque pela primeira vez se sentia compreendido por alguém.

Por ser muito jovem, Luhan raramente tinha alguma autoridade sobre os alunos para quem dava aulas – às vezes, de algumas garotas que não eram cegas e reparavam no quanto o professor era bonito. Mas Zhang Yixing sempre estava lá, prestando atenção em suas palavras de uma maneira quase religiosa, absorvendo cada uma das suas conversas e dos seus ensinamentos em uma confiança cega e admiração febril.

E não perderia uma aula de Luhan por nada. Nem que precisasse se molhar inteiro, literalmente. Porque sabia que, no fim, valeria a pena.

oOo

Assim que chegou ao portão do colégio e atravessou todo o corredor em direção a sua sala de aula, esbarrou com os colegas de turma. Vislumbrou, por cima dos ombros de Jongin, Luhan sentado em sua cadeira com a cabeça baixa e os pensamentos aparentemente longes.

“Quase ninguém veio por causa da chuva. Teve inundação por causa da chuva do outro lado da cidade e quem mora por lá ficou preso. Nós decidimos ir embora, não tem como haver aula com quatro estudantes.” Jongin explicou, pronto para voltar para a casa.

“Mas o professor está na sala!” Indignou-se o garoto, cruzando os braços no peito e apontando para a sala. “Se ele está lá, obviamente é porque quer dar aula.”

Jongin deu de ombros, franzindo levemente o cenho antes de ajeitar melhor a mochila nas costas. Yixing estava com as calças ensopadas, o tênis encharcado e as meias tão molhadas que chegava a se tornar incômodo. Tinha a impressão que se molharia menos caso tivesse saído de casa sem um guarda-chuva.

“É você quem sabe.” Disse Jongin simplesmente, dando de ombros. “Eu vou é voltar para a minha cama. Boa sorte com cálculos matemáticos, porque eu os dispenso.”

Yixing observou Jongin se afastar, estupefato. Jogou o guarda-chuva no corredor para não molhar a sala de aula e mordeu o lábio inferior quando Luhan ergueu o olhar para ele e sorriu aquele sorriso que era o favorito de Yixing. Ele parecia surpreso por algum aluno ter entrado e deixou aquilo transparecer em um arregalar adorável de lábios. O mais novo era o único na sala de aula.

“Olá, professor.” Yixing disse meio sem graça e coçou a nuca logo em seguida. “Você está bem?”

“Eu estou bem.” Luhan respondeu, fazendo um gesto para que Yixing se aproximasse e se sentasse na primeira carteira, em frente à mesa do professor. “Você aparentemente é o único disposto a estudar matemática às 7h da manhã de um dia em que o mundo parece que vai acabar. Acho que isso te dá um ponto adicional nas provas finais.”

“É.” Yixing concordou, sorrindo todo covinhas. “Eu acho que eu mereço algum incentivo por isso.”

“Mas não conte para ninguém.” O professor anotou alguma coisa na caderneta e então olhou para Yixing, entrelaçando os próprios dedos sobre a mesa. Desconfortável com o olhar do outro, o moreno chutou a mochila para baixo da mesa e desviou o olhar, pigarreando enquanto sentia o rosto meio quente em embaraço. “O que vamos fazer? Eu não posso passar matéria já que você é o único estudante.”

As coisas que passaram na cabeça do estudante eram tão erradas que seu rosto esquentou ainda mais. Gaguejou um “não sei” baixinho, tocando a própria bochecha.

“Para a nossa sorte, eu sabia que ninguém viria hoje.” O professor disse de repente, tirando de dentro da bolsa, que estava em cima da mesa, papéis coloridos como se fizesse uma mágica. “Então trouxe isso! Você sabe fazer origamis?”

“Não...” Respondeu, mordendo o lábio inferior e piscando.

“Você quer aprender? Por favor, diga que sim! Eu realmente não programei outra coisa.” Luhan riu, meio sem graça, e Yixing achou adorável o modo como ele o olhava, como se pedisse para não ser contestado.

“Eu adoraria.” O moreno respondeu finalmente, rindo de leve. Aceitou o papel vermelho que o professor lhe estendeu e o apoiou sobre a mesa, aguardando as primeiras instruções para tentar aprender alguma coisa. Era péssimo em artes manuais, mas não queria passar vergonha, por isso tentou se concentrar ao máximo no que Luhan explicava.

Às vezes, quando não entendia algum passo, o professor segurava suas mãos e o fazia amassar o papel da maneira certa, sempre paciente, com sua voz gostosa de ouvir e aquela calma que Yixing tanto gostava. Quando sentia qualquer contato físico por parte do mais velho, tinha vontade de sorrir ou cair em uma crise infantil de riso, mesmo que não entendesse muito bem o porquê de todas aquelas sensações. Sentia-se puramente e simplesmente feliz, como se pisasse em nuvens.

Passaram horas fazendo aqueles origamis e a mesa do professor já estava infestado deles. Entre risos, toques e palavras doces, Luhan o conquistou ainda mais. Era quase improvável, mas havia acontecido sem que pudesse fazer nada para impedir.

No fim, quando o final tocou e Yixing estava se preparando para ir embora, Luhan tocou seu braço e estendeu um pequeno unicórnio que fizera com um pedaço de papel branco.

“Ele é tão fofo quanto você. Não é um grande presente, mas...” Luhan coçou a nuca quando Yixing, maravilhado e com o coração batendo rápido, pegou o unicórnio de sua mão.

“É lindo! Obrigado.” Yixing riu, ajeitou a mochila no ombro e se aproximou do professor para beijar sua bochecha. Sentiu-se esquisito porque não era normal ter aquele tipo de contato com superiores, mas ao mesmo tempo foi bom sentir o cheiro do perfume sutil de Luhan. “Lindo como você.”


Com o rosto quente em embaraço, Yixing saiu da sala. Do lado de fora ainda estava chovendo, mas dentro dele havia raios de sol brilhando em todas as direções, fazendo-o sentir um calor confortável dentro de si. Com um riso e a convicção de que alguma coisa havia nascido entre aluno e professor, Yixing saiu na chuva, correndo com o unicórnio feito à mão seguro embaixo de sua camiseta.

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